''Porquanto, quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á; e quem perder a vida por minha causa achá-la-á'' (Mateus 16:25)
Estamos diante do texto que consideramos o fundamento do Evangelho ensinado por Jesus Cristo. Desde o início de Seu ministério, Jesus veio anunciando o Reino de Deus, que fora prometido por Deus por meio de seus profetas, e agora estava sendo inaugurado entre os homens através do ministério de Cristo: ''O tempo está cumprido, e o reino de Deus está próximo; arrependei-vos e crede no evangelho'' (Marcos 1:15). Porém, os judeus (povo que aguardava o Ungido de Deus que traria esse reino) contemporâneos a Jesus, e também seus compatriotas, não compreenderam a natureza deste reino, e nem ainda de seu Rei, enviado por Deus.
O reino que os judeus aguardavam da parte de Deus, era um reino político, terreno, que libertaria o povo judeu do jugo romano - o império que então dominava o mundo, inclusive a região de Israel. Mas Jesus aparece com uma mensagem que não tinha um cunho político, de libertação de Roma, mas uma mensagem de cunho puramente espiritual. Os sinais que eram realizados por Suas mãos - poder sobre as doenças, os espíritos malignos, a natureza - autenticavam Sua autoridade divina e faziam fluir multidões de pessoas, principalmente as carentes, e suas palavras e ensinos causavam a admiração de todos (Marcos 2:12; Mateus 7:28-29).
No auge do ministério público de Cristo, grandes multidões afluíam para serem curadas, a até para se alimentar (João 6:26), mas a mensagem de Cristo, a medida que foi se tornando mais clara e intensa, por se aproximar o dia em que Ele seria crucificado, também foi se tornando menos popular: '' À vista disso, muitos de seus discípulos o abandonaram e já não andavam com ele'' (João 6:66). O texto que nos dispomos a expor marca esse divisor de águas no ministério de Jesus. Mateus nos diz que ''Desde esse tempo, começou Jesus Cristo a mostrar a seus discípulos que lhe era necessário seguir para Jerusalém e sofrer muitas coisas dos anciãos, dos principais sacerdotes e dos escribas, ser morto e ressuscitado no terceiro dia''.
É neste contexto que Jesus expõe claramente que todos os que quisessem segui-Lo, isto é, tornar-se seu discípulo, deveriam ''perder suas vidas'' para ''salva-las''. Mas em que sentido Ele estava querendo dizer que devemos perder a vida? E que natureza teria esta salvação?
Em primeiro lugar, perder a vida significa romper com o pecado. O pecado com que nos apegamos, enganando a nós mesmos, com a falácia de que não são dignos da justa ira de Deus. E não estou me referindo apenas aqueles pecados visíveis horrendos, mas também aqueles que são cultivados no íntimo do coração, nos lugares ocultos da alma, onde somente nós e Deus conhecemos: ''Porque de dentro, do coração dos homens, é que procedem os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios, a avareza, as malícias, o dolo, a lascívia, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura. Ora, todos estes males vêm de dentro e contaminam o homem.'' (Marcos 7:21-23). Essa é uma doutrina fundamental do Evangelho, o seu próprio coração, de que Cristo veio morrer pelos pecadores, e todo o que não crê nisto, nega que Jesus foi enviado por Deus, e faz de Sua obra, algo inútil: ''Não vim chamar justos, e sim pecadores ao arrependimento''(Lucas 5:32). Quantos homens não aceitaram a Palavra de Cristo, a até zombam do Evangelho, tendo como tesouros os seus vícios, imoralidades, contendas e etc... os quais passarão, como a palha arrastada pelo vento, neste mundo, e os levarão à ruína eternamente. Mas Jesus nos chama ao arrependimento, isto é, o reconhecimento da perversidade do pecado e seu abandono, e para nos voltarmos para Ele e encontrar descanso em Seu perdão.
Perder a vida também significa romper os laços com o mundo. E quando falo em mundo, estou falando do sistema que é regido por Satanás, o deus desse século, que controla a mente dos homens, que ridiculariza tudo o que é santo, puro e honesto; que exalta e promove toda espécie de imoralidade e impurezas carnais, que corrompem os bons e puros costumes como a castidade, o casamento e a sã moral. E acima de tudo, que exclui e ultraja a Deus e Sua Glória, elevando a glória humana acima do Criador, que faz do homem o seu próprio deus, como se nós tivéssemos vida em nós mesmos! Não é necessário, portanto, dizermos que não há como mantermos uma comunhão real e saudável com Jesus e com o mundo ao mesmo tempo: ''Infiéis, não compreendei que a amizade do mundo é inimiga de Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus.'' (Tiago 4:4). Escolhamos a amizade e a paz com Deus, ainda que isso exija de nós a inimizade e a desaprovação do mundo.
Nenhum homem portanto, que queira ''salvar-se'', poderá hesitar em perder sua vida nestes sentidos fundamentais. O Reino que Jesus veio inaugurar da parte de Deus, portanto, é um Reino espiritual, que jamais terá fim, que está firmado sobre a realidade de Deus. Os princípios que o regem são a Graça, a Misericórdia, o Perdão, a Justiça. Jesus é o próprio Rei e Salvador do seu povo, mas o seu Reino não é visível neste mundo: ''Não vem o reino de Deus com visível aparência. Nem dirão: Ei-lo aqui! Ou: Lá está! Porque o reino de Deus está dentro de vós'' (Lucas 17:20a-21). E neste Reino, de fato, quando perdemos tudo o que na verdade não tem valor real, por causa de Cristo - o verdadeiro tesouro - vemos porque temos que perder para ganhar!