19 de abr. de 2020

Éfeso: A igreja descuidada. (Warren W. Wiersbe - Comentário Bíblico Expositivo)


Cada uma das sete mensagens começa com uma descrição pessoal ou designação de Jesus Cristo proveniente da visão do Senhor apresentada em Apocalipse 1 (no caso de Éfeso, ver Ap 1:12, 16, 20). A congregação de Éfeso havia tido líderes "estelares" - Paulo, Timóteo e o próprio apóstolo João mas o Senhor lembra seus membros que ele está no controle de seu ministério, colocando as "estrelas" onde lhe convém. Como é fácil a igreja tornar-se orgulhosa e se esquecer de que os pastores e mestres são dádivas de Deus (Ef 4:11) que podem lhe ser tomadas a qualquer momento. Algumas igrejas precisam ser advertidas a adorar ao Senhor, não ao pastor! 

Aprovação (w. 2, 3, 6). Quanta bondade do Senhor começar com essas palavras de elogio! Em primeiro lugar, esta era uma igreja que servia, trabalhando com zelo na obra do Senhor. Sem dúvida, sua agenda semanal era repleta de atividades. Também era uma igreja que se sacrificava, pois o termo "labor" significa "trabalhar até a exaustão". Os cristãos efésios pagavam um preço para servir ao Senhor. Eram uma congregação firme, pois o termo "perseverança" significa "resistência em meio às tribulações". Não desistiam diante da adversidade. 

A igreja de Éfeso era separada, pois examinava com cuidado os ministros que a visitavam (ver 2 ]o 7-11) para determinar se eram verdadeiros. Paulo havia advertido os presbíteros de Éfeso de que falsos mestres surgiriam vindos de fora e até mesmo do meio da igreja (At 20:28-31), e João os havia instruído a "[provar] os espíritos" (1 Jo 4:1-6). A igreja deve estar sempre alerta para detectar e rejeitar os ministros falsos de Satanás (2 Co 11:1-4, 12-15). 

Os cristãos de Éfeso separavam-se não apenas de doutrinas falsas, mas também de obras falsas (Ap 2:6). A forma verbal do termo nicolaita significa "conquistar o povo". Alguns estudiosos da Bíblia acreditam que se tratava de uma seita que "mandava" na igreja, privando o povo de sua liberdade em Cristo (ver 3 Jo 9-11) e que iniciou o que conhecemos hoje como a divisão entre o "clero" e os "leigos", uma falsa divisão não ensinada em parte alguma do Novo Testamento. Todo o povo de Deus é "sacerdócio real" (1 Pe 2:9; Ap 1:6) e tem o mesmo acesso ao Pai por meio do sangue de Jesus Cristo (Hb 10:19 ss). Veremos essa seita perigosa novamente ao estudar a mensagem para a igreja de Pérgamo. 

Os cristãos de Éfeso eram um povo sofredor, que suportava pacientemente seus fardos e labutava sem esmorecer. E faziam tudo isso por amor ao nome do Senhor! Ao examinar essa congregação de vários ângulos diferentes, ela parece perfeita. No entanto, Aquele que estava entre os candeeiros via o coração dos efésios, e, portanto, seu diagnóstico é diferente do nosso. 

Acusação (v. 4). Essa igreja ocupada, separada e disposta a se sacrificar sofria de "problemas amorosos" - os efésios haviam abandonado seu primeiro amor! Apresentavam "obras [...] labor [...] perseverança" (Ap 2:2), mas essas qualidades não eram motivadas pelo amor a Cristo (comparar com 1 Ts 1:3- "da operosidade da vossa fé, da abnegação do vosso amor e da firmeza da vossa esperança"). O que fazemos para o Senhor é importante, mas o motivo pelo qual o fazemos também importa! 

O que é o "primeiro amor"? É a devoção a Cristo que caracteriza, com freqüência, o recém-convertido: fervorosa, pessoal, desinibida, empolgada e demonstrada abertamente. É o amor da "lua-de-mel" de um casal (ver Jr 2:1, 2). Apesar de ser verdade que o amor conjugal maduro torna-se cada vez mais profundo e rico, também é verdade que nunca deve perder a empolgação e o fascínio dos primeiros dias de lua-de-mel. Quando o marido e a esposa deixam de dar o devido valor um ao outro e a vida se torna rotineira, o casamento corre perigo. 

É possível servir, sacrificar-se e sofrer "por causa do meu nome" e, no entanto, não amar Jesus Cristo verdadeiramente! Os cristãos de Éfeso estavam tão ocupados mantendo sua separação que deixaram de lado a adoração. O trabalho não substitui o amor; a pureza não substitui o fervor. A igreja precisa tanto de uma coisa quanto de outra a fim de agradar ao Senhor. 

Ao ler a epístola de Paulo aos efésios, há pelo menos vinte referências ao amor. Também se vê que Paulo enfatiza a posição exaltada do cristão "em Cristo [...] nos lugares celestiais". Mas a igreja de Éfeso havia caído e não vivia à altura de sua posição exaltada em Cristo (Ap 2:5). Só é possível servir a Cristo fielmente amando-o sincera e fervorosamente (Ef 6:24). 

Admoestação (vv. 5-7). O "primeiro amor" pode ser recuperado se forem seguidas as três instruções que Cristo dá. Em primeiro lugar, é necessário lembrar (literalmente, "continuar lembrando") o que foi perdido e cultivar o desejo de restabelecer a comunhão íntima. Em seguida, é preciso arrepender-se - mudar de ideia - e confessar os pecados ao Senhor (1 Jo 1:9). Em terceiro lugar, deve-se voltar à pratica das primeiras obras, o que indica a restauração à comunhão inicial, rompida pelo pecado e pela negligência. Para o cristão, isso significa orar, ler a Bíblia e meditar sobre ela, servir em obediência e adorar. 

Apesar dos privilégios que havia desfrutado, a igreja de Éfeso corria o risco de perder a luz! Por mais correta que seja sua doutrina, a igreja que perde o amor logo perde também a luz. "Venho a ti" (Ap 2:5) não é uma referência à volta de Cristo, mas sim à vinda de seu julgamento naquele momento e naquele lugar. Hoje, a cidade gloriosa de Éfeso não passa de um montão de pedras onde não brilha mais luz alguma. 

Apocalipse 2:7 deixa claro que os cristãos individuais dentro da igreja podem ser fiéis ao Senhor, a despeito das atitudes de outros. Nestas sete mensagens, os "vencedores" não são uma "elite espiritual", mas sim verdadeiros cristãos, cuja fé lhes deu vitória (1 Jo 5:4, 5). O homem pecador foi banido para longe da árvore da vida (Gn 3:22-24), mas, em Cristo, há vida eterna e abundante (Jo 3:16; 10:10). Desfruta-se essa bênção agora, e o será também, mais plenamente, na eternidade (Ap 22:1-5). 

A igreja de Éfeso era uma "igreja descuidada", constituída de cristãos descuidados que negligenciaram o amor por Cristo. Será que não fazemos o mesmo? 

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